CAPÍTULO 1
Gostaria de poder dizer que a humanidade se tornou melhor com os anos que passaram, mas infelizmente não foi assim que tudo aconteceu. O ano é 2050, a ganância por dinheiro e poder tirou o único vestígio de humanidade que ainda havia em nós, onde pessoas com poder permaneceram em segurança e aqueles que ficaram para trás lutaram por suas vidas, até não as terem mais.
Acordo mais uma manhã com o sol iluminando o pequeno cômodo que chamava de quarto, não é nenhum hotel cinco estrelas, mas é a melhor casa que arrumei entre as três últimas que estive, sinto que a cidade está cada vez mais vazia e silenciosa, até os pássaros sumiram nos últimos meses e logo o inverno chegaria. Resolvo então levantar da cama e tomar um banho antes de arrumar algo para comer, o piso da casa estava frio e para a minha infelicidade o aquecedor resolveu não funcionar então a água deve estar igualmente congelante.
Tiro minhas meias e minha calça moletom ontem realmente fez muito frio ao me olhar no espelho noto que havia perdido peso por comer tão mal nos últimos dias, retiro minha camisa de manga do corpo e as peças intimas ligando o chuveiro antes de desistir da ideia de um banho matinal. Suavemente as gotas de água se tornaram uma leve corrente, fria como gelo e sinto meu corpo estremecer, por sorte há produtos de higiene, aproveitei para lavar o cabelo que me pedia socorro a uns dois dias, resolvo que não iria demorar muito não quero arriscar gripar tão cedo no inverno então finalizo meu banho secando o corpo com a toalha e voltando para o quarto.
Ao retornar aquele quarto frio e levemente úmido pego minha mochila tirando uma calça jeans um pouco mais justa, uma camisa preta de mangas térmica que havia encontrado a dois dias atrás e meu tênis de sempre. Assim que me visto verifico o quarto se deixara algo e desço escadas na direção da cozinha, a casa é simples mas aparentemente confortável para duas pessoas, a cozinha era clara e aconchegante resolvo colocar minha mochila na pequena ilha da cozinha e verifico os armários achando um pote de café solúvel ainda em validade e um pacote pequeno de torradas que não estavam mofadas.
- Senhor pedi um café da manhã não um banquete – rio sozinha enquanto coloco um pouco de água para ferver e lavo uma caneca que encontrei no armário, já que teria que esperar um pouco mais resolvo verificar a casa, encontro pela sala algumas fotos de casamento e vejo um casal provavelmente da minha idade pareciam felizes e saudáveis, não gosto nem de pensar no que deve ter acontecido com eles. Não encontro nada muito útil na casa além de um casaco um pouco mais quente que o meu, resolvo trocar batendo a poeira e deixando o meu no lugar, assim que vejo a água já em fervura desligo o fogão e preparo o café. As vezes sinto falta de ouvir os pássaros ou o trânsito pela manhã, aos poucos todos ficaram doentes misteriosamente e as investigações feitas pela mídia foram constantemente silenciadas, ninguém sabia ao certo o que estava acontecendo e nem a medicina foi capaz de explicar, aos poucos algumas pessoas foram levadas para observar a doença com a promessa de serem tratadas, aos poucos mais pessoas foram levadas já não houve mais notícias sobre o destino que elas tiveram.
A situação começou a ficar suspeita aos poucos uma resistência foi estabelecida, muitos daqueles que tentaram fugiram foram caçados e acabaram mortos antes mesmo de serem levados, faz meses que não vejo nenhuma alma pelas ruas e temo que possa ser uma das últimas pessoas a estar escondida aqui, conforme o tempo passou uma grande barreira foi criada em volta das cidades para impedir aqueles que tentaram fugir para outros países, talvez seja um aviso para o destino inevitável que nos espera.
Finalizo meu café da manhã deixando tudo limpo como havia encontrado, não queria essa casa destruída por ratos ou qualquer outro animal antes de sai agradeci aquele casal na foto por usar a casa deles em esperança de que estejam seguros e em paz agora. Nesta manhã a neblina estava mais densa e a temperatura diminuindo cada vez mais, recolho minha mochila e verifico minhas facas e saio mais um dia na esperança de ainda encontrar pessoas por aqui. Entro em algumas casas pelos muros demolidos em sua maioria encontrando apenas casas vazias, objetos deixados para trás, brinquedos, roupas e fotografias de famílias muitas delas com animais de estimação também fotografados, me pergunto onde foram parar e sinto um aperto no coração com a ideia da solidão que provavelmente sentiram antes de partir.
Se fosse capaz de dizer as horas diria que seriam provavelmente oito da manhã, mas a neblina não me permite ver muita coisa, estava andando tranquilamente até ouvir grandes portões serem abertos e muitos passos, corro o mais rápido que posso me escondendo entre destroços de um muro escuro o suficiente para não ser vista nem com a neblina até que consigo ver soldados fardados com o brasão do governo, fortemente armados em um grande grupo. Como esses homens não adoecem como as outras pessoas, eu ainda não sei e temo que seja o que nunca foi nos contado até uma voz familiar se fazer presente na rua.
- Quero que vasculhem cada centímetro desse lugar, temos informações que ainda há possíveis infectados aqui quanto menos civis tiverem informações sobre isso tudo melhor, não podemos reverter o que foi feito, mas devemos apagar isso tudo – diz o jovem general Alec. Se pudesse descrevê-lo da melhor forma diria que é um homem com mais ou menos trinta anos, talvez deva ter um metro e setenta, olhos azuis inconfundíveis, cabelos escuros e uma disciplina com o governo maior do que seu bom senso. Ouço os soldados vasculhando casas em volta de mim e resolvo não confiar muito em meu esconderijo, retiro minhas facas da lateral da mochila com maior silêncio possível observando cada centímetro a minha volta antes de sair daquele lugar, dou pequenos passos até estar fora do terreno da casa e perceber dois soldados andando juntos removo uma das pedras que havia próximo ao muro e atiro na casa ao lado pela janela atraindo a atenção deles em minha direção oposta.
Com a respiração já ofegante pelo frio ando um pouco mais rápido na esperança que não me ouçam mas é quase impossível escapar dali sem machucar ninguém tomando uma difícil decisão, me escondo atrás de um carro na rua quando um soldado desatento passa muito próximo então lentamente me posiciono atrás dele e em um rápido movimento o agarro pelo pescoço, com os braços bloqueando sua passagem de ar o sentindo relaxar aos poucos – espero que me perdoe – deito ele na calçada atrás do carro e corro para o próximo quarteirão até darem falta do soldado apagado e localizam seu corpo na calçada enquanto me escondo em uma casa mais alta procurando uma visão melhor deles.
-Senhor o soldado trinta e dois foi apagado – informa o outro agente ao general, enquanto o acordam e ele informa aos colegas e superiores o que viu.
-Quero que encontrem a garota, se fez isso com um de vocês é capaz de fazer com todos – diz o general em voz firme – tentem não morrer – ele tira uma pistola que poderia jurar ser calibre doze de seu uniforme partindo em outra direção da cidade com um pequeno grupo.
Ótimo como se não bastasse esses caras no meu encalço agora tenho um general preciso pensar rápido em como vou sair daqui sem ser pega, olhando atentamente em volta só existem duas passagens possíveis uma o general com certeza estará a outra homens armados, eu não arriscaria minha vida dessa forma, então vou na opção menos ruim. Prendo minha mochila com mais firmeza em meu corpo para que não faça barulho e saio da casa pela porta dos fundos encontrando um pé de cabra na garagem, com certeza fará um trabalho melhor do que minhas facas. Corro o mais rápido que posso para o outro lado da rua, mas não consigo despistar um deles que vem na minha direção correr já não adiantaria o melhor que posso fazer é lutar, viro na direção dele e atinjo seu abdômen com toda força que tenho, com a parte afiada finco os ganchos em sua perna para que não me siga mas infelizmente o grito de dor vindo dele chama mais atenção do que deveria e tenho certeza que foi proposital ficando sem escolha a não ser correr para onde não queria.
Perto da divisa entre as duas partes da cidade sou agarrada pela mochila como um gato encurralado – me solta seu merda – agarro o ferro em minha mão e atinjo o soldado pela cabeça, não o incomodando tanto por causa do capacete, preciso de apenas alguns segundos para pensar antes de apanhar minha faca e o apunhalar na perna fazendo me soltar dizendo palavras sujas. Ele rapidamente tira a faca da perna e tenta alcançar a arma em seu corpo me obrigando a usar o ferro em minha mão para impedir que ele a alcance, sentindo seu olhar de ódio em mim quando de repente sou atingida por algo duro na costela me fazendo largar o pé de cabra e cair no chão. Antes mesmo que eu pudesse pensar em reagir sou agarrada pelos braços e minha mochila jogada pra longe sentindo a respiração falhar por conta da pancada aos poucos mais soldados se aproximaram me desarmando e me levantando em direção ao general que me observava com um ar vitorioso e arrogante.
- Então foi você que derrubou meu soldado, impressionante – o mesmo seguro meu queixo olhando todo meu rosto como se procurasse algo para debochar além da minha captura – não é de todo ruim, cuidado rapazes podem se apaixonar por um rostinho desses e acabarem mortos no outro dia – ouço risadas e mais piadas nojentas, aproveito a proximidade do general e cuspo em seu rosto deixando todos que estavam rindo em silêncio.
-Vai para o inferno, não se apaixone por mim general posso matar você – rio com deboche até ser atingida pela nuca e apagar completamente, sentindo que ali acabara minha liberdade e provavelmente a minha vida. Seria essa a sensação de morrer?